Educar para a diversidade, a interculturalidade e a paz

“A exigência que Auschwitz não se repita é a primeira de todas para a educação. De tal modo ela precede quaisquer outras que creio não ser possível nem necessário justificá-la. Não consigo entender como até hoje mereceu tão pouca atenção. Justificá-la teria algo de monstruoso em vista de toda monstruosidade ocorrida. Mas a pouca consciência existente em relação a essa exigência e as questões que ela levanta provam que a monstruosidade não calou fundo nas pessoas, sintoma da persistência da possibilidade de que se repita no que depender do estado de consciência e de inconsciência das pessoas. Qualquer debate acerca de metas educacionais carece de significado e importância frente a essa meta: que Auschwitz não se repita.” (Theodor Adorno, Educação após Auschwitz)

É inacreditável pensar que em pleno século XXI, quando somos capazes de enviar sondas e naves ao espaço e realizar cirurgias por robôs remotamente controlados, ainda não aprendemos a mais simples de todas as habilidades necessárias à nossa própria sobrevivência: a convivência pacífica.

Não há como não se chocar com as imagens da guerra (porque é uma guerra, e não um ‘conflito’ como os eufemismos dos jornais) que está (de novo!) ocorrendo entre Israel e Palestinos na faixa de Gaza. Centenas de mortos, muitos civis, dezenas de criancas, mulheres, idosos, indefesamente atacados com bombas. Centenas de feridos, lares destruídos, traumas que dificilmente serão superados pelos que sobreviveram. E para que?

As guerras sempre foram criadas por aqueles que detém o poder, manipulando a opinião do povo por meio de ideologias políticas, religiosas e culturais. Para que haja guerra é preciso que alguém enxergue o outro como diferente e como uma ameaça. O que levaria alguém a deixar seu país, sua família e seus amigos para matar pessoas que não conhece, que nunca lhe fizeram mal diretamente?

O filósofo Theodor Adorno, no texto que mencionei acima (que vale a pena ser lido, clique no link) está pasmo com a capacidade de alguns seres humanos de criar um aparato de guerra tão absurdamente sofisticado, planejado, burocrático e cruel para o propósito de eliminar outros seres humanos, discursivamente construídos como “diferentes”, “ameaçadores” e em consequência, “inimigos”. Ele chama de “barbárie” a capacidade de assassinar tão friamente populações inteiras sem sequer pensar nas causas e nas consequências de seus atos. E para ele, assim como para Hanna Arendt, a única saída possível para a barbárie é a educação.

Educação para a interculturalidade

Há uma rede de escolas em Jerusalém cujo principal objetivo, expresso em todo seu material, é o seguinte:

“Building peace. One student at a time” (Construindo paz. Um aluno de cada vez)

Esta escola é formada por alunos árabes e judeus em proporção semelhante. Lá, as crianças e os jovens aprendem ambas as línguas E em ambas as línguas. E crescem brincando com colegas com costumes diferentes nas vestimentas, na alimentação, na religião e nas relações familiares. Aprendem que podem apreciar as diferenças e serem amigos. E por que odiariam seus amigos? É assim que a paz se constrói: na convivência respeitosa com a diversidade.

Este lindo projeto é chamado “Hand in Hand” (de mãos dadas), e se você quiser conhecer mais, visite seu site (em inglês).

Recebi o link para um video feito por um pai, professor, designer gráfico e mero cidadão de Israel que fez um cartaz simples, que está rodando o mundo. Ele mostra um outro ponto de vista sobre a guerra: o de uma pessoa comum, não de um poderoso. O vídeo vale a pena ser visto. Confira aqui:

As guerras são feitas de cima pra baixo, pela imposição dos poderosos que se beneficiam delas. Mas a paz é feita de baixo pra cima, por pessoas como nós, que aprendem e ensinam nossos filhos, alunos, amigos, colegas de trabalho, a não fazer piadas racistas, a não humilhar quem tem outra língua, nacionalidade, etnia, condição social, orientação sexual, deficiência ou diferença. Por isso, os exemplos do Hand in Hand e do Rony (no video) são tão poderosos.

Precisamos nos educar, e educar as futuras gerações, para não cometer os mesmos erros do passado. Para aprender que o mundo pode ser compartilhado, que a diversidade é uma riqueza e que aprender a conviver é essencial para nossa sobrevivência e para nossa felicidade. Para que possamos aprender a apreciar a beleza de outros povos, línguas e culturas, sem precisar abrir mão das nossas. E se fosse preciso escolher apenas um objetivo para a educação, não há como discordar de Adorno: que seja a educação para a paz!

Filmes para ver e refletir:

Fahrenheit 11 de setembro, 2004, de Michael Moore.

O Senhor das Armas, 2005, com Nicolas Cage.

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2 thoughts on “Educar para a diversidade, a interculturalidade e a paz

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